PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. Pesquisa acadêmica. Acesso a dados dos cartórios extrajudiciais. Atestado de óbito. Possibilidade da pesquisa científica.

14 de setembro de 2018

PARECER

 

Trata-se de Pedido de Providências proposto por Geane Silva, aluna do curso de Mestrado em Modelos de Decisão e Saúde da Universidade Federal da Paraíba, por meio do qual solicita acesso a dados dos cartórios extrajudiciais acerca de atestado de óbito, para fins de pesquisa acadêmica.

Informações prestadas pela Gerência de Fiscalização Extrajudicial (Id. 110284).

Autos conclusos.

É o relatório.
Passo a OPINAR.

A respeito dos requerimentos esposados na Petição Inicial, a Gerência de Fiscalização Extrajudicial apresentou manifestação nos seguintes termos:

“O Coordenador do PPGMDS/CCEN/UFPB apresentou solicitação de coleta de informações, justificando que o projeto de pesquisa de mestrado da requerente tem por objetivo principal investigar o perfil dos óbitos das mulheres na Paraíba, de forma a construir um instrumento estatístico de tomada de decisão. Ademais, justificou que os cartórios foram selecionados através de um sorteio aleatório após cálculo amostral, bem como que as informações solicitadas no decorrer da pesquisa terão como período os anos de 2012 a 2017 e os seguintes elementos: local de ocorrência do óbito, causa do óbito, idade, cor/raça, estado civil, naturalidade e local de residência, profissão e escolaridade. Por fim, ressaltou que, para a realização da coleta, será utilizado um formulário a ser preenchido pelo pesquisador, não acarretando custo algum aos cartórios, inclusive firmado compromisso e respeito com o que diz a Lei de Acesso à Informação (Lei 12.527/2011) e a Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde, que trata da pesquisa com seres humanos.
Inicialmente, insta consignar que, conforme disposto no art. 80 da Lei 6.015/73, o assento de óbito conterá os seguintes elementos:
Art. 80. O assento de óbito deverá conter:
1º) a hora, se possível, dia, mês e ano do falecimento;
2º) o lugar do falecimento, com indicação precisa;
3º) o prenome, nome, sexo, idade, cor, estado, profissão, naturalidade, domicílio e residência do morto;
4º) se era casado, o nome do cônjuge sobrevivente, mesmo quando desquitado; se viúvo, o do cônjuge
pré-defunto; e o cartório de casamento em ambos os casos;
5º) os nomes, prenomes, profissão, naturalidade e residência dos pais;
6º) se faleceu com testamento conhecido;
7º) se deixou filhos, nome e idade de cada um;
8°) se a morte foi natural ou violenta e a causa conhecida, com o nome dos atestantes;
9°) lugar do sepultamento;
10º) se deixou bens e herdeiros menores ou interditos;
11°) se era eleitor.
12º) pelo menos uma das informações a seguir arroladas: número de inscrição do PIS/PASEP; número de inscrição no Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, se contribuinte individual; número de benefício previdenciário – NB, se a pessoa falecida for titular de qualquer benefício pago pelo INSS; número do CPF; número de registro da Carteira de Identidade e respectivo órgão emissor; número do título de eleitor; número do registro de nascimento, com informação do livro, da folha e do termo; número e série da Carteira de Trabalho.
Desta feita, percebe-se que à exceção do dado “escolaridade”, todos as demais informações encontram-se contidas no assento de óbito.
Por conseguinte, em que pese essas informações fazerem parte do assento de óbito, a filtragem desses dados poderá ser custosa, notadamente para as serventias que não dispõem de um sistema de automação com a captura e estruturação dessas informações, tudo isso porque grande parte desses dados não são de classificação obrigatória, já que a Lei 6.015/73 exige apenas que o cartório crie índice alfabético dos assentos lavrados pelos nomes das pessoas a que se referirem (art. 34).
Ademais, ressalte-se que os cartórios periodicamente informam uma série de dados ao IBGE sobre o óbito (data do óbito, idade do falecido, local de ocorrência, lugar do registro, lugar de residência do falecido, natureza do óbito, sexo), conforme obrigação contida no art. 49 da Lei 6.015/73, podendo ser um ponto de partida para uma filtragem de dados mais facilitada.
Por fim, a Secretaria da Saúde do Estado da Paraíba dispõe de um acervo de informações bastante estruturado quanto aos óbitos, notadamente para o estabelecimento de estatísticas de ocorrências e perfis para adoção de políticas públicas, cujo acesso se mostra bastante facilitado através do seguinte site http://sic.pb.gov.br.”

Segundo a manifestação supra, a coleta de informações diretamente no assento de óbito poderá ser custosa às serventias extrajudiciais, existindo, contudo, outras fontes de dados igualmente idôneas à pesquisa pretendida via IBGE e Secretaria de Saúde, através do site http://sic.pb.gov.br.

Entretanto, a jurisprudência administrativa sobre o tema tem firmado entendimento favorável à pesquisa acadêmica. A Corregedoria do Estado de São Paulo, por exemplo, em caso similar, decidiu considerando que “as informações armazenadas pelas serventias extrajudiciais – guardadas e conservadas sob responsabilidade dos notários e oficiais de registro, formando espécie de arquivo público, banco de dados com caráter público-, deve ser garantido a todos, independentemente de eventuais motivos apresentados ou da comprovação de interesse, ressalvadas as protegidas pelo sigilo e por restrições de acesso ao público assegurados por lei.” (CGJSP – Proc. n. 2012/00024481)

Com efeito, sob esse manto, e comungando com o mesmo entendimento, não há que se  tolher o direito acadêmico de pesquisa científica da aluna da UFPB, Geane Silva, que também encontra respaldo na Lei n. 8.935/1994, at. 30, XII, vejamos:

Art. 30. São deveres dos notários e dos oficiais de registro:

 XII – facilitar, por todos os meios, o acesso à documentação existente às pessoas legalmente habilitadas;

Note-se que o pedido está instruído com a chancela da Universidade respectiva e com o projeto de pesquisa, devidamente aprovado.

Por oportuno, é de registrar que quanto à reprodução e expedição de documento, integrante do acervo cartorário, será de total responsabilidade financeira da requerente o pagamento dos emolumentos correspondentes.

Assim, diante de tais consignações, OPINAMOS pela possibilidade da pesquisa científica requerida, cujo cronograma deverá ser apresentado ao juiz corregedor permanente da comarca respectiva, para que Sua Excelência estabeleça regras  para a devida pesquisa, ouvindo o delegatário responsável.

Com essas considerações, submeto o presente parecer à apreciação do Exmo. Desembargador Corregedor Geral de Justiça. Comunicações necessárias em caso de homologação.