PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. Cobrança de emolumentos. Cancelamento de hipoteca de bem imóvel. Mero ato de averbação sem valor declarado.

25 de novembro de 2019

PARECER

Vistos.

A Organização Social para o Desenvolvimento Sustentável e Capacitação – ODESC formulou Consulta perante esta Corregedoria Geral de Justiça, questionando qual o valor dos emolumentos que devem ser pagos às serventias extrajudiciais para fins de averbação do cancelamento de ônus hipotecário gravado sobre imóvel, especificamente em decorrência do disposto nos art. 3º e 4º da Lei Federal n. 13.340/2016.

Afirmou que o objeto de sua instituição, enquanto pessoa jurídica de direito privado, é exercido nos Municípios de Areia, Barra de Santa Rosa, Casserengue, Cuité, Nova Floresta, Picuí, Solânea e Remígio, havendo, em todos eles, mutuários de bancos oficiais federais cujas conjunturas correspondem às hipóteses de concessão de desconto ou de rebate para liquidação do débito, previstas na Lei n. 13.340/2016.

Aduziu que, após o adimplemento da obrigação com a instituição financeira, os ofícios de registro de imóveis estão cobrando dos mutuários, para fins de cancelamento da hipoteca respectiva, 0,5% (meio por cento) do valor da dívida liquidada, a título de emolumentos do ato de averbação, cobrança essa que reputa excessiva.

Pugnou, por essas razões, para que seja esclarecido qual o valor dos emolumentos que devem ser adimplidos na hipótese.

A Gerência de Fiscalização Extrajudicial prestou Informações, Id. 88812, afirmando que a questão já foi objeto de análise nos autos da Consulta autuada sob o n. 0000922-61.2017.8.15.1001, colacionando cópia das Informações prestadas naqueles autos, Id. n. 88815, em que sugeriu que, no cancelamento de ônus hipotecário gravado sobre imóvel, os emolumentos cobrados correspondem ao valor previsto na legislação estadual para a prática de ato de averbação “sem valor declarado”.

Apensados estes autos à Consulta n. 0000922-61.2017.8.15.1001, Certidão de Id. n. 96152, por ordem disposta no Despacho de Id. n. 89770, colacionou-se o Parecer nele exarado, pelo então Juiz Corregedor do Grupo II, José Herbert Luna Lisboa, a que foi atribuída eficácia decisória pelo Corregedor-Geral de Justiça, à época, Des. José Aurélio da Cruz, Id. n. 136549.

Na referida Manifestação, decidiu-se pela inadmissibilidade da Consulta, ao fundamento de que a pretensão consultiva somente deve ser dirigida a esta Corregedoria após ser suscitada perante o Juiz Corregedor Permanente da Comarca correlata, órgão reputado competente para apreciá-la originariamente, a partir do que dispõe os art. 44, §1º, do Código de Normas Judicial, 18, XIII, 250, 253 e 255, do Código de Normas Extrajudicial, ambos desta Corregedoria, ordenando-se o arquivamento.

É o relatório.

Tratando-se de pretensão de obtenção de informações concernentes à prestação do serviço notarial e registral, seu processamento e análise é de competência da Corregedoria-Geral de Justiça, ante seu dever de atuar como órgão de controle das atividades exercidas pelos delegatários, conforme previsto no art. 11, §2º da Lei Estadual n. 6.402/1996, além de competir-lhe, nos termos do art. 93, V, VIII e X do Regimento Interno do TJPB, a supervisão das serventias extrajudiciais e o disciplinamento dos atos que poderão ser subscritos pelos seus escreventes, podendo deliberar sobre os demais assuntos relativos à administração.

Registre-se que as previsões normativas referidas no Parecer da Consulta nº 0000922-61.2017.8.15.1001, cuja conclusão não vincula o entendimento a ser adotado nestes autos, não se adequam à hipótese fática analisada, seja por não se tratar de consulta formulada por servidor do Poder Judiciário, notário ou oficial de registro, no caso dos arts. 44, §1º, do Código de Normas Judicial, 18, XIII, e 250, do Código de Normas Extrajudicial, seja por não corresponder ao procedimento de Suscitação de Dúvida, com regulamentação específica no art. 252 e seguintes, também do Código de Normas Extrajudicial e Lei nº 6.015/73.

Por essas razões, a despeito do entendimento adotado na Consulta nº 0000922-61.2017.8.15.1001, conheço da pretensão deduzida nestes autos.

Verifica-se nos autos que os efetivos interessados na resposta a ser concedida na presente Consulta, ora representados, sem óbice normativo, pela Entidade Consulente, são mutuários que contrataram com instituições financeiras operações de crédito, cuja garantia hipotecária oferecida são bens imóveis.

A partir da hipótese fática dos autos, o objeto dos atos de registro foram os contratos de mútuos bancários garantidos por hipoteca de imóvel; uma vez registrado o instrumento contratual, deve haver, portanto, a transcrição da existência do ônus hipotecário às margens das matrículas dos bens oferecidos como garantia.

Inferindo-se que houve a conclusão do negócio jurídico avençado, seja por meio de declaração de quitação da dívida dada pelo credor ou por qualquer outro instrumento idôneo a denotar o adimplemento da obrigação pelo devedor, a extinção do ônus real anteriormente constituído ocorre, sob um juízo formal, a partir cancelamento ou baixa do registro de hipoteca, ato esse que não goza de qualquer reflexo financeiro.

A formalização da extinção do ônus hipotecário não deve ser interpretada como alteração contratual do negócio jurídico avençado, além de não ser revestida de economicidade, motivo pela qual os emolumentos devidos por sua averbação não devem ser calculados a partir do valor atribuído à avença pelos contratantes.

Não se admite, portanto, que os emolumentos devidos pelo simples ato de cancelamento ou baixa do registro de hipoteca – que, frise-se, apenas interessa à instrumentalidade jurídica e não afeta a expressão econômica do negócio – disponham da mesma base de cálculo que aqueles cobrados no ato principal, qual seja, no registro do contrato com garantia hipotecária, cujos valores, acertadamente, são associados ao valor declarado do negócio jurídico celebrado pelas partes, sob pena de incorrer-se em incontroversa bitributação.

O entendimento aqui exposado também foi adotado pela Corregedoria Geral de Justiça do Estado de Pernambuco, em Parecer1 formulado nos autos de um procedimento de consulta, publicado no DJPE em 13 de agosto de 2014, citado pela Gerência de Fiscalização Extrajudicial em suas Informações, e também pela Corregedoria Geral de Justiça do Estado do Mato Grosso, nos autos da Consulta n. 95/2008, Protocolo n. 139329/2008, de 13 de janeiro de 20092.

Fixada a premissa de que formalização da extinção do ônus hipotecário não dispõe de reflexos financeiros, os emolumentos cobrados não devem sofrer variação pela extensão da economicidade do negócio garantido pela hipoteca, e sim serem exigidos em valor fixo, condizentes, tão somente, com a natureza meramente cartorária do ato praticado.

A partir do disposto do Regimento de Custas Judiciais e Emolumentos Extrajudiciais do Estado da Paraíba, verifica-se que o cancelamento de hipoteca de bem imóvel se qualifica como mero ato de averbação sem valor declarado.

É o que ocorre em outros Estados da Federação, a exemplo dos Estados do Mato Grosso3, Rio do Grande do Sul4, Pará5 e São Paulo6.

Posto isso, conhecida a Consulta, entendo que o cancelamento de hipoteca de bem imóvel se qualifica como mero ato de averbação sem valor declarado, sendo cobrado o valor dos emolumentos de tal averbação para o ato.

Considerando que não mais subsistem as razões que justificaram o apensamento destes autos aos da Consulta n. 0000922-61.2017.8.15.1001, desapensem-nos.

É o Parecer que submeto ao crivo do Desembargador Corregedor-Geral de Justiça.

Gabinete na Corregedoria-Geral de Justiça do Estado da Paraíba, data da assinatura eletrônica.

Silmary Alves de Queiroga Vita

Juíza Corregedora

1“[…] Pois bem. Em se tratando de cancelamento ou baixa de registro de hipoteca, este deverá ser efetuado no Registro de Imóveis, com base em declaração de quitação da dívida dada pelo credor, liberando desse ônus o imóvel. Para tanto, procede-se com a averbação do ato.

Entende-se, nesse ser assim, que o valor dos emolumentos para registro está associado ao conteúdo econômico dos contratos à época da obtenção do crédito, diferentemente dos casos de averbação de baixa de ônus.

Os atos de simples averbação de extinção de ônus real ou de cancelamento de registro são distintos daqueles próprios de registro, que levam em consideração o valor econômico do negócio jurídico à época de sua celebração, não mais se justificando invocar esse fundamento para a base de cálculo da mera averbação de baixa de gravame, pena de se incorrer em bitributação.[…] Desse modo, esta Corregedoria Auxiliar para o Serviço Extrajudicial da Capital opina no sentido de que o cálculo das custas, taxas e emolumentos decorrentes da baixa e/ou cancelamento de hipoteca de bem imóvel deva ser elaborado considerando que a referida averbação não possui conteúdo financeiro.” (Parecer exarado pela Corregedoria Geral de Justiça do Estado de Pernambuco, nos autos da Consulta formulada pela Usina União e Indústria Ltda., em 13 de junho de 2014, publicado no DJPE em 13 de agosto de 2014).

2“A baixa da alienação fiduciária por motivo de quitação não pode ser encarada como alteração contratual, situação que implicaria num reflexo de operação econômica capaz de justificar a cobrança da averbação com valor declarado, mas sim como modificação de cunho eminente e meramente jurídica, sem impacto, repita-se, no conteúdo econômico, daí incidir o item que cuida da averbação sem valor declarado. (Parecer exarado pela Corregedoria Geral do Estado do Mato Grosso, Juiz Auxiliar Jones Gattas Dias, Consulta n. 95/2008, Protocolo n. 139329/2008, de 13 de janeiro de 2009).

3Consolidação das Normas Gerais da Corregedoria-Geral da Justiça do Foro Extrajudicial do Estado do Mato Grosso, Art. 236: A averbação sem valor declarado prevista no item 19, “a”, compreende os atos relativos a situações jurídicas sem conteúdo econômico, também encontrados no art. 167, II, da Lei nº 6.015/73, como, por exemplo: averbação de correção de nome; de alteração de estado civil; de nome de via pública; de número de cadastro de imóvel, rural ou urbano; de atualização de confrontantes; de encerramento de matrícula; de anúncio de existência de ação de anulação de ato jurídico, quando do mandado não constar valor da causa; de existência de pacto antenupcial devidamente registrado no livro 3-auxiliar, mesmo que de outra comarca (art. 224, Lei nº 6.015/73); de cancelamento de ônus e gravames; de restabelecimento da sociedade conjugal; das cláusulas de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade.

4Tabela de Emolumentos do Estado do Rio Grande do Sul: […]

OBSERVAÇÃO AOS ITENS 1 E 2: (…) 4 – Nas averbações de cédulas hipotecárias e nos cancelamentos de hipotecas, os emolumentos serão cobrados de acordo com o item 1 “Sem valor declarado”.

5Tabela de Emolumentos do Estado do Pará: […]

[07] Averbação (…) 7.8) O cancelamento da Hipoteca e da Alienação Fiduciária, para fins de emolumentos, deverão ser considerados como ato de averbação sem valor declarado.

6Tabela de Emolumentos do Estado de São Paulo: […]

NOTA: As averbações de cancelamento de hipoteca cedular rural ou penhor cedular rural serão cobradas com desconto de 80% (oitenta por cento) dos valores fixados no item 2 da Tabela II dos Ofícios de Registro de Imóveis. (Termo de acordo de redução de emolumentos publicado no Diário Oficial do Estado de São Paulo de 20 de fevereiro de 2003).

DECISÃO

Vistos.

Considerando que após a análise da Solicitação de Esclarecimentos, feita pela ODESC – Organização Social para o Desenvolvimento Sustentável e Capacitação, que ensejou o presente PP, a MM Juíza Auxiliar do Grupo II desta Corregedoria concluiu, em seu Parecer, ID 150995, que a formalização da extinção do ônus hipotecário não deve ser interpretada como alteração contratual do negócio jurídico avençado, além de não ser revestida de economicidade, motivo pelo qual os emolumentos devidos por sua averbação não devem ser calculados a partir do valor atribuído à avença pelos contratantes, não se admitindo, portanto, que os emolumentos devidos pelo simples ato de cancelamento ou baixa do registro de hipoteca – que, frise-se, apenas interessa à instrumentalidade jurídica e não afeta a expressão econômica do negócio – disponham da mesma base de cálculo que aqueles cobrados no ato principal, qual seja, no registro do contrato com garantia hipotecária, cujos valores, acertadamente, são associados ao valor declarado do negócio jurídico celebrado pelas partes, sob pena de incorrer-se em incontroversa bitributação, entendimento também adotado pela Corregedoria Geral de Justiça do Estado de Pernambuco, em Parecer formulado nos autos de um procedimento de consulta, publicado no DJPE em 13 de agosto de 2014, citado pela Gerência de Fiscalização Extrajudicial em suas Informações, e também pela Corregedoria Geral de Justiça do Estado do Mato Grosso, nos autos da Consulta n. 95/2008, Protocolo n. 139329/2008, de 13 de janeiro de 2009, concluindo que a formalização da extinção do ônus hipotecário não dispõe de reflexos financeiros, devendo os emolumentos cobrados não sofrer variação pela extensão da economicidade do negócio garantido pela hipoteca, e sim exigidos em valor fixo, condizentes, tão somente, com a natureza meramente cartorária do ato praticado, homologo o referido Parecer, que servirá de resposta à Consulente.
Oficie-se.

Arquive-se.

João Pessoa, datado e assinado eletronicamente.
Des. Romero Marcelo da Fonseca Oliveira
Corregedor-Geral da Justiça